terça-feira, 23 de outubro de 2012

I miss the game


A notificação vermelhinha foi como outra qualquer, à primeira vista. Um moço, que ela conheceu um dia antes, em umas dessas discussões ideológicas nas quais as pessoas falam muito e ninguém convence ninguém de nada. Tinham concordado, embora não completamente, e ele tinha um aspecto simpático e um ‘quê’ porteño. Claro que na internet a pessoa tem que ser muito chinela pra não parecer interessante, mas ainda assim, pelo menos ele não era muito chinelo.

Maiúsculas, acentos, pontuação no lugar. Até demais... mas ótima velocidade de digitação e excelente compreensão da vadiagem intrínseca ao ser humano. A conversa fluiu bem de mais, até que ela não teve mais como disfarçar que sabia o que estava acontecendo. Elogios geralmente entregam os caras, e esse era particularmente doce.

O problema é que a única alternativa realmente honesta seria não ter aceitado o convite. Até o aceite pode ser considerado o que o querido leitor quiser, e ela sabia que era exatamente isso, justamente porque tinha gostado daquela fotinho cercada de palavras (beleza nunca foi um must – já coolness...). A banda dele era bem mais ou menos, mas quem se importa? Pelo menos com as influências ela não tinha nenhum problema, pelo contrário.

Decidiu pela honestidade relativa e abriu o jogo na deixa seguinte. Disse que a ineficácia do movimento não era por conta dele, mas do namorado. Não tinha certeza se era verdade, mas como o namorado era de verdade as verdades decorrentes disso ficavam confortáveis para ambos.

Pecou no excesso de simpatia, claro, não sabemos se por vaidade ou pena, ou os dois. Independentemente do motivo, continuaram listando preferências e fazendo piadas, até que as indiretas sobre lugares a ir ficaram frequentes de mais.

Pensou no namorado, primeiro a quem queria mesmo ser fiel a vida inteira, e decidiu por uma honestidade pior, pedindo abertamente o fim da conversa e apontando o flerte explicitamente. Como qualquer moço esperto faria, ele aproveitou para insistir, e por pouco não narrou os beijos que lhe daria se pudesse.

Terminaram – ela terminou – a conversa abruptamente. Continuar seria explicitamente errado, depois de tantas intimidades.

Minutos depois ele ainda enviou mais um link, de um conto sensível que ele mesmo escreveu. Ela gostou, mas não quis responder para não alimentar a interação.

Passou o resto do expediente escutando as influências da banda dele e, de vez em quando, relendo trechos da conversa.

No mundo ideal, nunca mais se falaram, e ela viveu feliz para sempre com o namorado ao qual prometeu honestidade, com a consciência suficientemente tranquila.

No mundo real, geral torce pra ela não postar nenhuma dessas músicas.

FIM.

Moral da história: gostar do game é uma merda.

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